caros amigos e amigas,
O Projeto Homospiritualis reproduz abaixo a carta assinada recentemente em Florianópolis pelas 3 principais instituições que discutem o tema ensino religioso escolar, hoje em dia:
O
Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso (FONAPER), a Associação
Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Teologia e Ciências da Religião
(ANPTECRE) e a Sociedade de Teologia e Ciências da Religião (SOTER),
preocupados com o processo de implementação e consolidação do Ensino
Religioso nas escolas públicas, vêm, através desta Carta Aberta à
Sociedade Brasileira, tornar público seus posicionamentos a fim de
esclarecer, direcionar e aprofundar o debate sobre o papel desta área do
conhecimento e componente curricular na formação básica do cidadão.
No que se refere aos aspectos legais, destacamos que o Ensino Religioso é:
I - disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental (Cf. § 1º do art. 210 da Constituição Federal);
II - parte integrante da formação básica do cidadão, assegurado o
respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer
formas de proselitismo, sendo que os conteúdos e as normas para a
habilitação/admissão de seus professores devem ser definidos e
regulamentados pelos sistemas de ensino, que poderão ouvir entidade
civil constituída pelas diferentes denominações religiosas (Cf. Lei nº
9.475/97, que altera o Art. 33 da LDB nº 9.394/96);
III
- componente curricular situado no âmbito da educação sistemática e
formal, articulado com os princípios e fins da educação nacional,
devendo contribuir para o pleno desenvolvimento do educando e seu
preparo para o exercício da cidadania (Cf. Art. 2º da LDB n° 9.394/96),
promovendo a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de
atitudes e valores, que fortaleçam os vínculos familiares, os laços de
solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se assenta a vida
social (cf. Art. 32 da LDB n° 9.394/96);
IV
- uma das áreas de conhecimento a integrar a base nacional comum da
Educação Básica, a qual é constituída por conhecimentos, saberes e
valores produzidos culturalmente, compreendidos como essenciais ao
desenvolvimento das habilidades indispensáveis ao exercício da cidadania
(Cf. art. 14 da Resolução CNE/CEB nº 4, de 13 de julho de 2010, que
institui as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação
Básica);
V
- componente curricular e área de conhecimento obrigatória do Ensino
Fundamental, de matrícula facultativa ao aluno, assegurado o respeito à
diversidade cultural e religiosa do Brasil e vedadas quaisquer formas
de proselitismo (Cf. Art. 15 da Resolução CNE/CEB n° 7/2010, que Fixa
Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 9 (nove)
anos).
Enquanto
componente curricular, o Ensino Religioso deve atender à função social
da escola, em consonância com a legislação do Estado Brasileiro,
proporcionando o conhecimento dos elementos básicos que compõem o
fenômeno religioso, a partir de uma abordagem pedagógica que estuda,
pesquisa e reconhece a diversidade cultural-religiosa brasileira,
vedadas quaisquer formas de proselitismos (Cf. Parâmetros Curriculares
Nacionais de Ensino Religioso (FONAPER, 1997)).
Assim,
longe de se embasar no ensino de uma religião ou das religiões na
escola, a manutenção do Ensino Religioso em um Estado laico se justifica
pela necessidade de formar cidadãos críticos e responsáveis, capazes
de discernir a dinâmica dos fenômenos religiosos, que permeiam a vida
em âmbito pessoal, local, nacional e mundial. As diferentes crenças,
grupos, tradições e expressões religiosas, bem como a ausência delas,
são aspectos da realidade que devem ser socializados e abordados como
dados socioculturais, capazes de contribuir na interpretação e na
fundamentação das ações humanas.
Desde
a promulgação da Lei n° 9.475/97, muitas ações foram realizadas, em
âmbito nacional, para a efetivação do Ensino Religioso, como componente
curricular, dentre as quais se destacam:
I
- a sua adequada implementação por centenas de sistemas estaduais e
municipais de ensino, inclusive com a publicação de propostas e
diretrizes curriculares e contratação de professores habilitados em
Ensino Religioso através de concursos públicos;
II
- a promoção constante de eventos científicos, fóruns, encontros e
debates, abordando a natureza epistemológica e pedagógica do Ensino
Religioso, dentre os quais merecem destaque as 11 edições do Seminário
Nacional para a Formação de Professores em Ensino Religioso (SEFOPER) e
as 06 versões do Congresso Nacional de Ensino Religioso (CONERE)
promovidos pelo FONAPER, em parceria com diferentes instituições de
ensino superior que oferecem cursos na área de Ciência(s) da(s)
Religião(ões) ou afins, em níveis de graduação e de pós-graduação;
III
- as diferentes iniciativas de formação inicial e continuada dos
professores de Ensino Religioso, oferecidos por inúmeros sistemas de
ensino e instituições de ensino superior, inclusive em nível de
licenciatura, como ocorre nos Estados do Maranhão, Minas Gerais,
Paraíba, Pará, Rio Grande do Norte e Santa Catarina, dentre outros;
IV
- o significativo crescimento da produção científica de ordem
epistemológica e pedagógica, incluindo a publicação de obras, revistas,
cadernos, documentos e páginas eletrônicas que veiculam artigos,
trabalhos e acontecimentos relacionados com o Ensino Religioso;
V
- a criação de um Grupo de Trabalho (GT) de Religião e Educação na
Associação Nacional de Pós-Graduação de Teologia e Ciências da Religião
(ANPTECRE) e na Sociedade de Teologia e Ciências da Religião (SOTER),
com massiva participação de docentes-pesquisadores na socialização de
pesquisas e de práticas educativas nesta área de conhecimento;
VI
- a inclusão de 05 ementas no documento final da Conferência Nacional
de Educação (CONAE), o qual subsidia a elaboração do novo Plano
Nacional de Educação (PNE) para a década de 2011-2020, determinando
que: a) a diversidade religiosa seja inserida, no Programa Nacional do
Livro Didático, de maneira explícita; b) se desenvolva e amplie-se
programas de formação inicial e continuada sobre diversidade
cultural-religiosa; c) os estudos da diversidade cultural-religiosa
sejam inseridos no currículo das licenciaturas; d) os editais voltados
para pesquisa sobre a educação da diversidade cultural-religiosa sejam
ampliados, dotando-os de financiamento; e e) o ensino público se paute
na laicidade, sem privilegiar elemento desta ou daquela tradição e/ou
movimento religioso.
Entretanto,
diante de inúmeros outros fatos e impasses que dificultam a
consolidação do Ensino Religioso no país, defendemos que:
I
- o Ministério da Educação (MEC) publique diretrizes curriculares
nacionais para o Ensino Religioso, a fim de orientar os sistemas de
ensino na elaboração de suas propostas pedagógicas em consonância com os
pressupostos legais e curriculares em vigor na atualidade;
II
– o Ministério da Educação (MEC), por meio do Conselho Nacional de
Educação (CNE), emita diretrizes curriculares nacionais para a formação
inicial dos professores de Ensino Religioso, em curso de licenciatura,
de graduação plena, nos termos do art. 62 da LDB nº 9.394/96;
III
– o Supremo Tribunal Federal (STF) aceite a Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI), proposta pela Procuradoria Geral da
República (PGR), para assentar que o Ensino Religioso em escolas
públicas só pode ser de natureza não-confessional, declarando a
inconstitucionalidade do artigo 11, do Decreto n° 7.107/2010, que aprova
o Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil, o qual prevê que o
Ensino Religioso seja “católico e de outras confissões religiosas”;
IV
- o Ministério da Educação (MEC), por meio da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, fomente a oferta dos
cursos de formação inicial para professores de Ensino Religioso no
âmbito do Plano Nacional de Formação de Professores da Educação
Básica/PARFOR;
V
- o Conselho Nacional dos Secretários Estaduais de Educação/CONSED e a
União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação/UNDIME reconheçam
o Ensino Religioso como área do conhecimento e promovam sua oferta em
todas as escolas de ensino fundamental das redes públicas de ensino do
Brasil, nos termos da Lei n° 9.475/1997;
VI
- o Congresso Nacional incorpore no novo Plano Nacional de Educação
(PNE) estratégia que garanta a promoção do respeito à diversidade
religiosa nas escolas, respeitando-se o princípio da laicidade do
Estado, com a proibição de práticas de proselitismo religioso e de
Ensino Religioso confessional.
Isto
posto, reafirmamos que é fundamental manter o Ensino Religioso
presente no cenário educacional, a fim de continuar assegurando aos
educandos das escolas públicas o acesso ao conhecimento religioso
produzido pela humanidade, contribuindo para conhecimento e respeito da
diversidade religiosa do povo brasileiro.
Para
tanto, convidamos a todos os envolvidos na sociedade a participarem
deste amplo debate, aliando-se às ações e proposições que buscam
consolidar o Ensino Religioso como direito do cidadão, em prol da
promoção da liberdade religiosa e de uma sociedade profundamente
democrática.
Florianópolis, 14 de outubro de 2011.
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